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  Entrevista
«A Constituição impede
eventual recandidatura
de Eduardo dos Santos»

- 2-Jul-2005 - 0:07


Simão Cassete, representante da Frente para a Democracia (FpD) na Europa, passa a pente fino a situação em Angola

Em 1975 rasgou o cartão de militante, mandou às favas o MPLA e “passou-se” para a Organização Comunista de Angola (OCA). Três anos depois o movimento liderado por Agostinho Neto ordenou a sua detenção, pela DISA, na antiga prisão de São Paulo durante dois anos. Vinte e quatro meses, sem nunca ter sido julgado, foi o tempo que viu o Sol a nascer aos quadradinhos. Hoje, Simão Cassete levanta o cassetete, fala alto e grosso afirmando - longe da terra, pois claro -, sob sua conta e risco, que José Eduardo dos Santos não tem moral para se apresentar de corpo inteiro como Presidente de todos os angolanos. Mais: acusa Manuel Rui Monteiro de se ter exibido, em 1992, de arma à cintura para matar angolanos que eram indiferentes ao autor do "Quem me dera ser Onda".


Por Jorge Eurico

Notícias Lusófonas - Está em Portugal, depois de em 1992 ter-se candidato às eleições presidenciais em Angola, há mais de uma década. Renunciou à nacionalidade angolana?

Simão Cassete - Mantenho-me angolano. O facto de residir no exterior é apenas uma casualidade circunstancial. E isso não me retira o direito de preservar a cidadania angolana.

NL - Que notícias tem tido de Angola?

SC - Todas quantas os meios de Comunicação Social possibilitam. Hoje em dia com o recurso à Internet, todas as informações chegam com a ligeireza de um clic no teclado de um computador. Portanto, isso permite manter-me informado sobre os factos relevantes que ocorrem no País.

NL - As notícias que vão chegando do País são ou não animadoras?

SC - Há um misto de expectativas positivas com alguma apreensão pelo meio. Naturalmente que há ganhos que resultam do facto da sangria que a guerra representava ter terminado. No entanto, também há expectativas criadas em torno da paz que continuam adiadas, nomeadamente aquelas que se referem ao desenvolvimento económico, social, à reconstrução nacional e ao restabelecimento da normalidade político-constitucional.

«Só haverá normalidade quando forem retomados os ciclos eleitorais»

NL - Ainda não há normalidade político-constitucional em Angola?

SC - Só haverá normalidade político-constitucional quando de facto a Lei Constitucional for respeitada, quando forem retomados os ciclos eleitorais e quando um conjunto de instituições que conforma o poder democrático estiver instalado exercendo em pleno as suas funções.

NL - Falou de um misto de expectativas positivas com alguma apreensão pelo meio, isto no que respeita às notícias que vai tendo de Angola. Quer ser mais explícito?

SC - Reparem, considero que o esforço feito ao nível da legislação eleitoral acaba por ser um esforço mitigado na medida em que não se projecta nessa legislação aquilo que é fundamental para o País. Antes pelo contrário, estabelecem-se algumas condicionantes que visam salvaguardar os interesses do partido maioritário na actual composição da Assembleia Nacional. Ou seja, é preciso projectar determinadas leis fundamentais do País numa perspectiva duradoura. Angola não pode continuar a viver com uma legislação a prazo. Temos que projectar uma Lei Constitucional ou Eleitoral que seja para durar mais do que uma legislatura. E isso pressupõe que não deve haver receios de se adoptar mecanismos que visem garantir a eficácia dessas leis. Não podemos daqui a quatro anos chegar à conclusão de que precisamos de uma outra Lei Eleitoral. Há aspectos na presente Lei Eleitoral que não dão estabilidade ao processo. Cito um exemplo: é fundamental que o processo do registo eleitoral e a constituição dos cadernos eleitorais sejam feitos com margem suficiente de garantia de seriedade nesse processo. Ora, quando se admite que esses cadernos eleitorais podem ser alterados a escassos dias do processo eleitoral, estamos a admitir um quadro que pode propiciar polémicas que são perfeitamente escusadas.

NL - O que é que hoje, do ponto de vista político, é fundamental para o País?

SC - O retorno à normalidade democrática. Não podemos continuar a ter um País onde os seus órgãos de gestão tenham a legitimidade mitigada. Os processos eleitorais têm que decorrer dentro dos prazos constitucionais independentemente da vontade dos concorrentes. A Lei (Eleitoral) deve ser respeitada. E se a Lei estabelece que há eleições de quatro em quatro anos, isso é para cumprir. Se a Lei estabelece que há eleições de cinco em cinco anos, isso é para cumprir. Portanto, é tudo isso que conforma a normalidade democrática.

NL - Há quanto tempo é que não põe os pés em Angola?

SC - Há um ano.

NL - A sua actividade política, aqui em Portugal, está congelada?

SC - Tenho ligação com a Frente para a Democracia (FpD). Enquanto membro da FpD, dou o meu contributo apesar de me encontrar fora do País.

NL - O que é que significa para si o 22 de Fevereiro de 2002?

SC - O 22 de Fevereiro de 2002 está associado a dois factos: a morte de Jonas Savimbi e ao estabelecimento de um cessar-fogo, que conduziu à paz que temos.

NL - A paz foi até 22 de Fevereiro de 2002 refém do MPLA e da UNITA?

SC - Naturalmente! Eram ambos (o MPLA e a UNITA) os promotores da guerra.

NL - Vamos viajar no tempo para lhe perguntar que recordações guarda do encontro que, em companhia de outros políticos, manteve em 1992 com Jonas Savimbi?

SC - Esse foi um momento muito particular do País após às eleições de 1992 e a crise que se estabeleceu. A análise que fazíamos era de que se corria o risco de se retornar à guerra com toda as consequências que daí resultariam para os angolanos: o adiamento do desenvolvimento económico e social do País. Portanto, nessa altura foi consensual que se deviam encetar todos os esforços no sentido de se encontrar uma saída política que evitasse essa catástrofe. E é nesse contexto que me desloco ao Huambo e mantive as conversações com Savimbi e outras figuras políticas que, na altura, também se deslocaram ao Planalto Central. Pelo menos pela parte que me toca, o espírito era o de tentar encontrar uma solução política para a crise que se tinha estabelecido de forma a evitar o retorno às armas. Infelizmente não fomos bem sucedido no sentido de evitar a catástrofe. Julgo que hoje nenhum angolano deixará de reconhecer, que diante do saldo extremamente destrutivo da guerra passada, que teria valido a pena ter feito todo o esforço no sentido de se evitar essa catástrofe.

«Nunca tinha tido a mais pequena simpatia por Jonas Savimbi»

NL - Notícias que correram na altura davam conta que Jonas Savimbi, nesse encontro, lhe tinha dado uma atenção especial em detrimento de outros políticos. O que é que terá dito ao então presidente da UNITA?

SC - Nunca tinha tido a mais pequena simpatia por Jonas Savimbi. E não estava ali sequer em nome de Savimbi. Estava ali em nome de um projecto político que se defendia em Angola e pelo qual era importante haver paz. E julgo que da parte dele havia aquela tradicional desconfiança em relação aquilo que ele chamava os crioulos de Luanda. Havia também uma certa imagem da parte dele em relação à FpD. No primeiro contacto até referiu esse facto, porque nós (FpD) éramos considerados como um partido que cortava a direito. Havia uma clareza de posições da nossa parte. Criticávamos posturas da UNITA como condenávamos as posições do MPLA. Foi um momento de auto-avaliação. Depois de quebrado o gelo, começamos a falar e transmiti-lhe o que é que motivava a minha ida ao seu encontro. E acho que depois dele se ter apercebido de um ponto comum, que era uma visão sobre o País, passamos a dialogar com uma abertura completa. Daí se calhar as palavras simpáticas que posteriormente ele usou referindo-se a mim.

NL - Que imagem Jonas Savimbi tinha dos crioulos em geral e da FpD em particular?

SC - Jonas Savimbi não tinha qualquer pejo em manifestar as suas opiniões. Há várias opiniões dele dessa altura que reflectem a ideia que ele tinha sobre aquilo que ele designou como os crioulos de Luanda. Portanto, a UNITA tinha criado um pouco a imagem, inclusive ainda hoje há sectores do partido do Galo Negro que gostam de destacar essa faceta que quanto a mim não corresponde necessariamente à realidade de que havia uma Angola ruralizada que era representada pela UNITA e a urbanizada que era representada pelo MPLA e pela elite que era identificada como pertencente ao partido no poder. Ora, essa é uma realidade que quanto a mim é distorcida na medida em que a sociedade angolana tem elites transversais que independentemente da sua origem rural detinha formas de poder e a própria UNITA era exemplo disso. Não se pode dizer que a elite dirigente da UNITA era necessariamente rural. Havia na direcção da UNITA muitos homens urbanos. Se o critério fosse esse, também poderiam ter-se identificado crioulos na UNITA.

«Desde o período colonial que tenho intervenção política»

NL - Quantos anos tinha e como aparece como candidato às eleições presidências de 1992 em Angola?

SC - Na altura tinha 36 anos. Eu não tenho intervenção política na altura em que apareço como candidato às eleições presidenciais. Eu já tinha intervenção política desde o período colonial. No fundo aquilo que acaba por determinar a minha candidatura foram circunstâncias muito particulares. Enquanto membro da direcção da FpD tinha participado em toda a negociação que constituiu a Coligação Angola Democrática e uma das questões que tinha ficado em aberto era candidatura das eleições presidenciais para a qual havia sido definido um perfil para o candidato e depois faltava escolher quem é que se encaixava dentro desse perfil. Para surpresa minha, as direcções dos partidos que integraram a coligação confrontaram-me com a escolha unânime de que eu deveria ser o candidato um pouco fruto, provavelmente, da forma que tinha conduzido o processo que levou à criação da coligação e da intervenção política que até lá tinha tido com maior visibilidade depois dos Acordos de Bicesse, particularmente na altura da reunião multipartidária em que, num dado momento, dirigi a delegação FpD que participava nesse encontro. Portanto, tudo isso provavelmente levou que se criasse a opinião de que eu seria um bom candidato à eleições presidenciais.

NL – Na campanha eleitoral usou uma rosa: era apenas um adereço ou tinha um significado especial?

SC - A rosa foi adoptada como símbolo da Coligação Angola Democrática. Eu era o candidato pela coligação. A adopção da rosa teve todo o simbolismo a que se associam as flores e particularmente a rosa como símbolo de harmonia, amor e cordialidade. A rosa, do nosso ponto de vista, era algo que casava perfeitamente com aquilo que defendíamos como projecto político, que era a defesa intransigente da paz, da reconciliação entre os angolanos, da defesa do retorno a uma estabilidade económica, social e política e ao mesmo tempo de promoção do desenvolvimento dos angolanos.

NL - A conferência multipartidária foi secundada por uma entre a UNITA e o MPLA. Sentiu em algum momento que estes dois partidos vos tinham à volta?

SC - A UNITA recusou-se a participar na reunião multipartidária tendo considerado que aquilo não passava de uma farsa para o MPLA e o Governo retirarem vantagens.

NL - Ou seja, a UNITA não se quis misturar com partidecos?

SC - Era a expressão usada na altura pela UNITA e por Jonas Savimbi! A questão é que a reunião multipartidária tinha regras regimentais que foram adoptadas e o critério adoptado para a aprovação das resoluções foi o do voto. E em muitas das situações as posições do MPLA foram derrotadas pela maioria. O que aconteceu é que independentemente desses resultados, o MPLA referiu que aquilo não poderia ser vinculativo na medida em que o seu parceiro nos Acordos de Bicesse não estava presente e que teria necessariamente que obter a anuência do seu parceiro para que essas resoluções fossem levadas a efeito. Ora, em algumas situações, o que constatamos é que a chamada bipartidária que sucedeu à reunião multipartidária, o MPLA e UNITA decidiram adoptar pontos que tinham sido rejeitados na reunião multipartidária. Aliás, o paradoxal do processo de paz angolano é que os dois adversários de armas tornavam-se facilmente aliados em determinados momentos, o que provava claramente que o que estava em causa para eles não era de maneira nenhuma o interesse nacional, mas somente a partilha ou a assumpção do poder em Angola.

NL - O MPLA só respeitava a UNITA devido à força das armas?

SC - Infelizmente uma das razões que levou ao prolongamento da guerra foi exactamente o facto de nunca ter havido da parte do poder em Angola uma visão que permitisse encontrar caminhos para a resolução da guerra civil sem ser sobre a perspectiva de que todo o poder deveria ser mantido pelo Governo e pelo partido que o sustentava. Ora, quando se projecta um País não é possível pensar no poder total. É preciso abrir portas para permitir que as tensões se diluam partilhando de alguma maneira a vários níveis do poder. Aliás, o facto de não se realizarem eleições para outros níveis de poder, debilita o processo de reconciliação nacional. Ou seja, o País ganharia mais se os angolanos pudessem sentir que havia fatias de poder que poderiam ser exercidas por cidadãos pertencentes a outras formações políticas que não o MPLA desde que essa fosse a escolha do eleitorado. Portanto, considero ser vital para a consolidação do processo democrático a realização de eleições autárquicas em Angola. Porque a simples possibilidade de se exercer algum poder em determinadas zonas políticas e administrativas do País pode conduzir também a uma certa distensão da sociedade.

NL - Vamos admitir a hipótese que tivesse ganho as eleições presidenciais em 1992. Como é que dirigiria o País neste contexto de paz?

SC - Na altura da campanha eleitoral, naquela série de entrevistas que foram feitas a alguns candidatos pela Televisão Pública de Angola (TPA), eu deixei claro a minha visão em relação ao exercício do poder presidencial. Acho que para um País que tinha vivido um longo período de confronto e de fractura social, era importante que o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, se assumisse como um elemento confederador da vontade nacional que contribuísse efectivamente para a reconciliação dos angolanos. E por isso mesmo é que em coerência com essa minha posição, foi que quando candidato suspendi a minha relação partidária como sinal de que entendia que um Presidente da República não devia manter um vínculo directo com qualquer formação política. Essa era uma postura que caracterizaria o meu exercício de poder em Angola. Naturalmente que dentro do quadro constitucional procuraria ser um elemento estabilizador, promotor da concórdia nacional naturalmente exercendo a vigilância em torno da legalidade constitucional. E certamente que não adiaria a entronização de todos os órgãos previstos na Constituição, nomeadamente os diversos órgãos que o estatuto-jurídico prevê que ainda hoje continuam adiados. Eu primaria que houvesse uma efectiva independência do poder judicial, legislativo, uma verdadeira Liberdade de Imprensa e criaria os mecanismos necessários do exercício dos direitos políticos-partidários em perfeita harmonia com a Lei, de forma que a democracia representasse um ganho claro para os angolanos.

«Num Estado democrático não pode haver um caso como o de Cabinda»

NL - Ainda não temos um Estado de direito democrático de facto?

SC - A prática é o critério da verdade. Se olharmos para o País, temos em determinados sectores retrocessos em relação aquilo que se considera um Estado de direito democrático. Não podemos de maneira alguma admitir que num Estado democrático de direito persista um conflito militar como o que existe em Cabinda e não se procure uma solução política para este conflito. Não se pode tolerar que, em determinadas províncias, a Imprensa privada esteja proibida de circular. Não podemos permitir que num Estado de direito democrático governadores provinciais mantenham a prática de mandar prender jornalistas por ter escrito uma matéria que lhes desagrade. Essa prática é completamente contraditória com aquilo que é a democracia.

NL - José Eduardo dos Santos também é seu presidente?

SC - Formalmente não posso dizer que não o seja, agora teria sido positivo para Angola se pudesse ver nele um defensor claro dos interesses dos cidadãos nacionais. E isso passaria por um exercício de poder menos partidarizado. O facto de ele se manter presidente do MPLA retira-lhe a autoridade moral para se apresentar de corpo inteiro como Presidente de todos os angolanos.

NL - José Eduardo dos Santos não foi eleito nas eleições de 1992 e você admite-o como Presidente da República: não acha que há um aqui um paradoxo na sua posição?

SC - Naturalmente que é questionável a legitimidade do exercício de Presidente da República pelo cidadão José Eduardo dos Santos. Agora, tem que haver um certo pragmatismo. Para todos os efeitos, a solução que constitucionalmente ficou consagrada para aquilo que seria o período de transição era que ele (José Eduardo dos Santos) cessaria as suas funções com a tomada de posse do Presidente da República eleito. Processo esse que, lamentavelmente, não foi concluído. Poder-se-ía ter encontrado uma solução política para essa situação, que julgo que não feriria de maneira nenhuma a legitimidade de quem exercesse o poder. Enfim, mas quando digo que formalmente tenho que o reconhecer como meu Presidente da República, é na medida em que ele exerce esse cargo. As questões políticas associadas naturalmente que não deixam de ser colocadas. Por isso é que considero que teria sido útil que houvesse da parte dele todo o empenho do retorno à normalidade constitucional que passaria necessariamente por ter passado à convocação das eleições tão logo foram criadas as condições para o efeito. E é preciso dizer que existiram condições que poderiam ser investidas no retorno à normalidade democrática desde a assinatura dos Acordos de Lusaka.

«A recandidatura de Eduardo dos Santos é uma entorse para a democracia»

NL - O que é que representaria, para si, a recandidatura de José Eduardo dos Santos às próximas eleições presidenciais?

SC - Representaria uma entorse para a democracia em Angola. Apesar de haver opiniões de que os mandatos por ele exercido até agora não terem resultado de uma legitimidade expressa, isso lhe conferiria o direito de apresentar uma candidatura para as próximas eleições. Discordo disso na medida em que a Constituição vigente é perfeitamente clara. Mesmo sem ter tido a legitimidade, ele exerceu estes mandatos à luz desta Constituição. É em nome dessa Constituição que ele nomeou figuras para cargos de Estado. Será que isso não se aplica quando se refere a mandatos presidenciais? A Constituição é clara! Nenhum angolano à luz dessa Constituição pode exercer o poder presidencial por mais de 15 anos. Portanto, feitas as contas, ele estaria neste momento a cumprir o terceiro mandato à luz da Constituição. Isso retira-lhe o direito de se recandidatar. Inclusive há um argumento demolidor na medida que a Constituição impede que um eleito exerça por mais de 15 anos o mandato presidencial.

NL - Subscreve a ideia expressa recorrentemente, por alguns políticos angolanos, segundo a qual José Eduardo dos Santos manter-se-á no poder até aos seus últimos dias devido ao compromisso que tem com alguns membros do seu partido e sobretudo com generais das Forças Armadas Angolanas (FAA)?

SC - Só subscrevo um projecto democrático em Angola. Portanto, essa ideia para mim é completamente absurda. É imperativo que retornemos à normalidade democrática. E a normalidade democrática significa que o Presidente da República tem que ser eleito; tem que cumprir os mandatos de acordo com o que a Constituição estabelece e ponto final! Admitir que José Eduardo dos Santos se mantenha no poder por via de entendimentos estabelecidos no seio do seu partido é perfeitamente absurdo. Nenhum partido se sobrepõem à Nação. Angola tem de ser um projecto maior em relação a qualquer projecto partidário. Mal de nós se continuarmos a admitir que há partidos cuja legitimidade se sobrepõe à legitimidade nacional. A Nação é soberana e é a única que pode estabelecer o primado nas regras da convivência do País.

NL - Ganhado o MPLA as próximas eleições perpetuar-se-á o principio segundo o qual "benesses para os mesmos, sacrifícios para uns"?

SC - O País só tem a ganhar se houver uma alternância de poder. Acho que há uma prática de exercício de poder em Angola que está viciada. É preciso arejar o poder em Angola, mas é claro que isso é critério do eleitorado.

NL - Voltando ao passado, o que é que o levou a abandonar Luanda para fixar-se em Lisboa?

SC - Há uma série de factos que ocorreram que deverão estar apagados da memória da maioria das pessoas. Alguns já esqueceram que, no final de Outubro de 1992, houve um afloramento de violência, nomeadamente nas principais cidades, em Luanda em particular, em que figuras da oposição foram alvos de uma acção prossecutória e em alguns casos com detenções e sujeitos à violência física. Felizmente consegui escapar a essa experiência, mas senti que havia um clima de hostilidade orquestrado contra mim e que na altura a avaliação que se fez é que essa orquestração, que era crescente, poderia conduzir à violência extrema da qual poderia resultar inclusive na minha eliminação física.

NL - O escritor Manuel Rui Monteiro afirmou, em tempos, em entrevista a um órgão de Comunicação Social, que o senhor não tinha razões para abandonar Luanda até porque ninguém o conhecia, e, que, portanto ninguém lhe faria mal.

SC - O mal de alguns angolanos é acharem que são eles que determinam quem é ou não conhecido. Provavelmente para Manuel Rui Monteiro, que se exibiu de arma à cintura perseguindo outros compatriotas na altura, se calhar o critério de se matar angolanos é-lhe indiferente. Eu era tão desconhecido que fui retirado do avião numa altura em que me preparava para viajar para o exterior. Eu era tão desconhecido que esse acto foi exercido por um grupo de militares armados que cercou o avião e que exigiu que saísse da aeronave. Portanto, se isso é sinónimo de anonimato eu teria preferido ser anónimo e não estar sujeito a esse tipo de violência gratuita. As pessoas que tentaram chegar à minha casa e vandalizar a viatura na qual andava, só o fizeram porque alguém lhes recomendou esse serviço. E talvez Manuel Rui Monteiro possa ter uma explicação sobre isso.


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